Raticidas Cumarínicos
Nome e Sinônimos
Rodenticida (Anticoagulant rodenticides, long-acting anticoagulants), brodifacum (brodifacoum), bromadiolona (bromadiolone), difenacum (difenacoum), clorofacinona (chlorophacinone), difacinona (diphacinone), pindona (pindone), indandiona (indandione), difetialona (difethialone), valona (valone), flocumafen (flocoumafen), cumafuril (coumafuryl), cumacloro (coumachlor), varfarina (warfarin), raticida cumarínico, cumarinas, supervarfarina (superwarfarin), indandiona (indandione).
Resumo
Os raticidas com propriedades anticoagulantes são os mais frequentemente utilizados em nosso meio e estão relacionados à exposições/intoxicações em todas as faixas etárias. Atualmente, são os únicos autorizados pela ANVISA. A maioria dos acidentes ocorrem em crianças de forma acidental e em adultos em tentativas de suicídio. Os raticidas anticoagulantes de ação longa (supervarfarinas) são divididos em dois grupos: os derivados cumarínicos (brodifacum, difenacum e bromadiolona) e os derivados da indandiona (clorofacinona, difacinona, e pindona). Apresentam ação anticoagulante potente e prolongada. Possuem em comum a estrutura 4-hidroxicumarina. A via de exposição mais comum é a oral. São compostos sólidos (em pó, farelo, pasta, blocos parafinados, tabletes, pellets e granulados). São coloridos, geralmente na cor vermelha ou rósea. As apresentações possuem uma concentração do princípio ativo variável. O brodifacum e bromadiolona são os agentes comumente encontrados, geralmente, na concentração de 0,005% (0,05 mg por grama) em envelopes de 25 g. São inibidores competitivos da Vitamina K, por isso o antídoto utilizado em casos de sangramentos ou alterações da coagulação é a Vitamina K (fitomenadiona). Não deve ser usada profilaticamente. Não há uma dose tóxica em humanos bem estabelecida. Para decisão da conduta terapêutica é necessário saber se a ingestão foi acidental ou intencional. Ingestões acidentais usualmente ocorrem em crianças e habitualmente não tem toxicidade. Ingestões intencionais ocorrem em outras faixas etárias e estão associadas a maiores quantidades, podendo resultar em intoxicações.
Descrição
Raticida pertencente ao grupo denominado "superwarfarins", devido à ação anticoagulante potente e prolongada. Possuem em comum a estrutura 4-hidroxicumarina. Os raticidas cumarínicos, atualmente, são os únicos autorizados pela ANVISA, registrados como Saneantes.
Raticida cumarínico em grânulos coloridos
Raticida cumarínico em sementes embebidas em solução
Classe/Uso/Apresentação
Classe: Raticida Cumarínico
Apresentação Comercial: Podem ser encontrados como granulados, iscas, pellets, blocos parafinados, pó ou às vezes como sementes embebidas em solução, geralmente de coloração rosa ou azul.
Derivados Cumarínicos | Nomes Comerciais | Derivados da Indandiona | Nomes Comerciais |
Brodifacum | Klerat®, Ratak®, Ratokill® | Clorofacinona | Ratomet® |
Bromadiolona | Bromoline®, Maki® | Difacinona | Ramik® |
Cumacloro | Tomorin® | Pindona | Pival® |
Difenacum | Sorexa® | Valona | |
Flocumafeno | Flocoumatec® | ||
Cumafeno | |||
Cumatetralil | Fulmirat® | ||
Difetialona | Rodilon® |
-KLERAT®: concentração 0,005% de brodifacum = 0,05 mg por grama. Apresentação: ISCAS (granulado) de cor avermelhada, envelopes de 25 gramas (= 1,25 mg de brodifacum). BLOCO PARAFINADO de cor azul escura, com 20 gramas (= 1 mg de brodifacum) ou mini-bloco de 5 gramas (= 0,25 mg de brodifacum);
-RATAK®: ISCAS de cor verde, concentração 0,001% de brodifacum = 0,01 mg por grama, envelopes de 75 gramas ( = 0,75 mg de brodifacum).
Toxicidade Aguda
A dose tóxica em humanos não está totalmente estabelecida. Exposições repetidas apresentam maior risco que dose única. Para decisão da conduta terapêutica é necessário saber se a ingestão foi acidental ou intencional. Ingestões acidentais usualmente ocorrem em crianças e habitualmente não tem toxicidade. Ingestões intencionais ocorrem em outras faixas etárias e estão associadas a maiores quantidades, podendo resultar em intoxicações. ATENÇÃO: Estar atento à possibilidade de ingestão de chumbinho (agrotóxico de uso ilegal utilizado como raticida clandestino, a descrição do produto e os sintomas apresentados auxiliam no diagnóstico) |
Superwarfarins:
- Apresentam meia-vida longa (6 a 8 semanas), quando comparados ao warfarin (meia–vida de 40h) podendo ser detectados após semanas da ingestão.
- Apresentam potência 100 vezes maior em relação ao warfarin, por isso a intoxicação por superwarfarin é mais grave.
- São altamente distribuídos no tecido subcutâneo.
Mecanismo de Ação
São inibidores competitivos da Vitamina K, interferindo na carboxilação final dos fatores II (protrombina), VII, IX e X, dos quais ela é co-fator. Os "superwarfarins", ou raticidas de segunda geração, têm o mesmo mecanismo dos cumarínicos, porém grande potência e efeitos prolongados. Mesmo em dose única, se a quantidade ingerida for muito grande, podem causar anticoagulação prolongada.
Manifestações Clínicas
INGESTÃO
INTOXICAÇÃO AGUDA: Efeitos hemorrágicos surgem somente após depleção dos fatores de coagulação K dependentes (II, VII, IX e X) , em média 1 a 2 dias; precocemente podem surgir em 8 a 12 horas.
INTOXICAÇÃO CRÔNICA: Em exposição continuada, mesmo em doses menores, efeitos hematológicos são mais graves e prolongados que na exposição aguda.
GRAVIDADE E QUADRO CLÍNICO NAS INTOXICAÇÕES POR RATICIDAS CUMARÍNICOS:
Exposição assintomática | Sem alterações nos exames de coagulação e sem manifestações hemorrágicas. OBS: As crianças em ingestão acidental incluem-se nesta categoria. |
Intoxicação leve | Distúrbios da coagulação detectados somente por análise laboratorial. |
Intoxicação moderada | Distúrbios de coagulação resultando em hematomas, equimoses, epistaxe, hematúria, melena, sangramento excessivo em pequenos cortes, sangramento gengival, hemorragia conjuntival. |
Intoxicação grave | Sangramento gastrointestinal severo, hemorragia retroperitonial; acidente vascular cerebral, decorrendo manifestações neurológicas; hemorragia interna resultando em choque. |
Tratamento
1. Ingestão ACIDENTAL de pequenas quantidades/Paciente assintomático: Casos geralmente envolvendo crianças ou adultos (confirmada que a ingestão foi acidental) em pequenas quantidades e assintomáticos.
'''Medidas de descontaminação ''': Não há indicação de procedimentos de descontaminação gastrintestinal.
Medidas terapêuticas e exames laboratoriais: Se confirmada ingestão de pequenas quantidades de forma acidental, o paciente pode ser liberado sem necessidade de medidas terapêuticas ou solicitação de exames.
OBSERVAÇÃO: Estudos recentes (3,5,6) mostram que não há necessidade de qualquer procedimento terapêutico em ingestões acidentais em crianças, visto que a quantidade ingerida é insuficiente para causar alterações. Foram estudados aproximadamente 1.000 casos de ingestões acidentais em crianças em que não foi realizado procedimento de descontaminação, apenas acompanhamento com TAP seriado, sem que houvesse alterações significativas. Sendo assim, baseado nestes dados de literatura, não se recomenda procedimentos de descontaminação e nem seguimento de TAP nestes casos. O mais importante nestes casos é educar os pais com relação ao armazenamento adequado dos produtos. É claro que é necessário ter bom senso: se a suspeita é de uma GRANDE ingestão (mais do que um pacote de 25 gramas), pode-se optar por 1 dose de carvão ativado via oral e controle de TAP.
2. Ingestão INTENCIONAL e/ou grandes quantidades ou dúvida quanto à circunstância: Casos de tentativa de suicídio.
'''Medidas de descontaminação ''': Devido à baixa letalidade, não há indicação formal de lavagem gástrica. Caso a quantidade ingerida seja muito grande (alguns pacotes de 25 gramas) e há menos de uma hora, pode-se orientar uma dose de carvão ativado por via oral. Utilizar 1g/kg de peso corpóreo (dose máxima de 50g, diluindo-se cada 1g em 8ml de solução).
Medidas terapêuticas e exames laboratoriais: Solicitar TAP/RNI na admissão (para descartar ingestão repetida/crônica) e, conforme o resultado desse exame, orientar:
1) Se RNI de admissão igual ou inferior a 2,0: Repetir em 48 horas e orientar avaliação psicológica/psiquiátrica (Obs: se o paciente estiver sem ideação suicida e tiver uma rede social de amparo adequada, pode ser liberado, com orientação de retornar em 48 horas para repetir o TAP/RNI).
1.1) Se repetiu RNI em 48 horas e o mesmo for igual ou inferior a 2,0: Liberar após avaliação psicológica/psiquiátrica.
1.2) Se repetiu RNI em 48 horas e o mesmo for maior que 2,0: ver item 2.
2) Se RNI de admissão maior que 2,0:
2.1) Iniciar vitamina K por via oral: 1 ampola de 12 em 12 horas até RNI igual ou inferior a 2,0 (quebrar a ampola e administrar por via oral)
2.2) Orientar controle de TAP/RNI de 12 em 12 horas e, conforme o resultado deste, orientar:
:*Se RNI igual ou inferior a 2,0: Parar vitamina K e repetir RNI após 48 horas (Obs: se o paciente estiver sem ideação suicida e tiver uma rede social de amparo adequada, pode ser liberado, com orientação de retornar em 48 horas para repetir o TAP/RNI).
::*Se RNI após 48 horas estiver igual ou menor que 2,0: Alta hospitalar após avaliação psicológica/psiquiátrica.
::*Se RNI após 48 horas estiver acima de 2,0: Repetir vitamina K via oral - 1 ampola de 12 em 12 horas, controle de RNI de 12 em 12 horas até chegar a 2,0. A partir de então suspender vitamina K por 48 horas, repetir RNI em 48 horas e assim sucessivamente (Obs: se o paciente estiver sem ideação suicida e tiver uma rede social de amparo adequada, pode ser liberado, com orientação de retornar em 48 horas para repetir o TAP/RNI).
3. Em casos de sangramento: Iniciar vitamina K, 1 ampola via oral a cada 6 horas se o paciente puder deglutir. Caso não consiga deglutir pode-se administrar por via parenteral. Discutir o uso de plasma fresco congelado com a equipe (depende da intensidade do sangramento). Monitorar o TAP/RNI a cada 12 horas até RNI de 2,0, a partir de então suspender vitamina K por 48 horas, repetir RNI em 48 horas e assim sucessivamente (Obs: se o paciente estiver sem ideação suicida e tiver uma rede social de amparo adequada, pode ser liberado, com orientação de retornar em 48 horas para repetir o TAP/RNI).
Antídoto
Vitamina K1 (Fitomenadiona)
A vitamina K só deve ser indicada na evidência de alteração de coagulação ou sangramento. Não usar vitamina K profilática.
Via: A via oral de administração é priorizada em relação à intramuscular ou endovenosa, uma vez que está associada a menos efeitos colaterais. A via endovenosa deve ser a escolha apenas nos casos de sangramentos agudos.
Dose: 1 ampola de 12 em 12 horas até RNI igual ou inferior a 2,0.
Nome Comercial: Kanakion MM; Kavit (ampolas de 1 ml contendo 10 mg de fitomenadiona (vitamina K1)
Meia-vida: 6-10 horas
Absorção: Absorção oral é ampla
Metabolismo: Hepático.
Excreção: Urinária e fecal.
Exames/Monitorização
Realização de TAP/RNI, conforme o fluxograma, para verificar o estado de coagulação do paciente.
Se o paciente estiver sem ideação suicida e tiver uma rede social de amparo adequada, pode ser liberado, com orientação de retornar em 48 horas para repetir o TAP/RNI. Casos em que o paciente não retornou para repetir o exame, encerrar o caso.
Fluxograma
Referências
1-Superwarfarin intoxication: hematuria is a major clinical manifestation. Wu et al, 2007. J Thromb Haemost 2007; 5 Supplement 2:218
2-Caravati et al. Long-acting anticoagulant rodenticide poisoning: An evidence-based consensus guideline for out-of-hospital management. Clinical Toxicology (2007) 45, 1–22
3-Michael E. Mullins, Christina L. Brands, and Mohamud R. Daya. Unintentional Pediatric Superwarfarin Exposures: Do We Really Need a Prothrombin Time? Pediatrics 2000; vol 105 no 2
4-Watt BE et al. Anticoagulant rodenticides. Toxicol. Rev 2005;24(4):259-69
5-Ingels M et al. A Prospective Study of Acute, Unintentional, Pediatric Superwarfarin Ingestions Managed Without Decontamination. Ann Emerg Med 2002 Jul;40(1):73-8.
6-Shepherd G et al. Acute, unintentional pediatric brodifacoum ingestions. Pediatr Emerg Care. 2002 Jun;18(3):174-8
7-TOXBASE (NPIS). Anticoagulant rodenticides, long acting - features and management. Disponível em: http://www.toxbase.org/. Acesso em: abril 2013.
8- Poisindex (Micromedex). Antocoagulants-long acting. Disponível em: http://www.micromedexsolutions.com Acesso em: abril 2013.
Elaboração: Equipe CIATox/SC Atualizado em: Março de 2018.
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