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Lavagem gástrica

Resumo

A lavagem gástrica (LG) é um procedimento invasivo utilizado para remoção de resquícios de agente tóxico presentes no estômago do paciente, por meio do uso de um tubo inserido pelo nariz ou pela boca do paciente.

A LG não deve ser realizada rotineiramente no tratamento de pacientes intoxicados.

Nos raros casos em que é indicada, ela deve ser realizada apenas por profissionais com treinamento e experiência adequados, avaliando para cada caso específico os benefícios previsíveis e os riscos potenciais do procedimento.

Estudos recomendam que as indicações da LG são para casos de ingestão de substâncias com elevada toxicidade sistêmica e com doses potencialmente fatais, que não sejam adsorvidas pelo carvão ativado (CA), que não tenham antídoto disponível e que chegarem em até uma hora após a ingestão ou, eventualmente, mais tempo, em casos de retardo de esvaziamento gástrico somado à alta toxicidade da substância.

Caso o paciente esteja sintomático na admissão, a absorção já deve ter ocorrido, portanto deve-se avaliar a possibilidade de o relato do tempo de ingestão estar equivocado, desta forma não há indicação de lavagem gástrica.

Determinar qual paciente será beneficiado pelo procedimento não é simples. Além da restrição da indicação, segundo as orientações atuais, é comum que no atendimento na emergência, informações essenciais para a indicação do procedimento, como horário do evento, substância e quantidade ingerida, estejam incorretas, tornando ainda mais duvidoso o benefício do procedimento.

Indicações

  • A lavagem gástrica está indicada em ingestões de substâncias potencialmente fatais (pela quantidade ou tipo de agente tóxico), que não sejam adsorvidas pelo carvão ativado (CA), nem tenham antídoto disponível, em até 1 hora após ingestão e se não houver contraindicação.
  • Quanto mais precoce a realização da lavagem gástrica, maiores são as possibilidades de retirada do agente tóxico.
  • Se o paciente estiver comatoso (Glasgow ≤ 8) deverá ser intubado antes do procedimento de lavagem gástrica.
  • Considerar a lavagem gástrica, por até 2 horas, após a ingestão de dose tóxica maciça que ocasione ameaça à vida com as seguintes substâncias:
Substâncias para considerar LG até 2 horas após a ingestão
Beta-bloqueadores
Bloqueadores dos canais de cálcio
Cianeto
Ferro
Paraquate/diquate
Colchicina
Anfetaminas
Bupropiona
Fármacos que formam bezoares
Substâncias que causem gastroparesia

Contraindicações

  • Ingestão de dose não tóxica;
  • Substância com baixo potencial tóxico;
  • Ingestão de:
    • cáusticos ou corrosivos, com exceção do paraquate (dose acima de 1g), que por ter um efeito sistêmico muito importante, mesmo sendo cáustico, a lavagem gástrica é indicada;
    • hidrocarbonetos com alta volatilidade, solventes em geral (devido ao alto risco de aspiração);
    • materiais sólidos com pontas (alfinetes, agulhas, vidros, etc);
    • pacotes contendo drogas.
  • Substâncias com antídoto disponível e/ou que o carvão tenha efeito;
  • Se um paciente se recusar a cooperar e resistir ao procedimento;
  • Pacientes com escala de Glasgow ≤ 8, exceto se forem intubados;
  • Pacientes com risco eminente de rebaixamento do nível de consciência, pelo risco de broncoaspiração. É importante ressaltar a necessidade de reavaliações periódicas dos pacientes, que devem ser frequentes, com intervalo dependendo da gravidade do caso, visto que podem evoluir para coma, justificando a intubação para proteção de vias aéreas.
  • Varizes de esôfago de grosso calibre;
  • Hematêmese volumosa;
  • Cirurgia recente do trato gastrintestinal (ex: gastroplastia);
  • Paciente com arritmia cardíaca;
  • Paciente com hipotermia;
  • Paciente em estágio avançado de gestação;
  • Paciente que apresente vômito frequente;
  • Paciente com convulsão.

Procedimento

Lavagem gástrica. Fonte: Anant, J. K et al

Lavagem gástrica. Fonte: Anant, J. K et al

  • A lavagem pode ser feita com sonda oro ou nasogástrica. A vantagem da sonda orogástrica é o fato de ser mais calibrosa facilitando a retirada das substâncias tóxicas. No entanto, é um procedimento menos tolerado pelos pacientes. Na maioria das situações, utiliza-se uma sonda nasogástrica que deve ser o mais calibrosa possível para facilitar a remoção do toxicante.
  • A posição ideal é o decúbito lateral esquerdo com a cabeça em nível inferior ao corpo. Deve-se explicar ao paciente como será o procedimento, para que colabore para a passagem da sonda.
  • Para a colocação da sonda nasogástrica, faz-se uma estimativa do comprimento (lóbulo da orelha, ponta do nariz, apêndice xifóide), coloca-se lidocaína gel na extremidade distal e na narina escolhida. Durante a colocação, flexiona-se o pescoço do paciente e pede-se para engolir. Deve-se confirmar a localização adequada da sonda antes de prosseguir com a lavagem gástrica.
  • Normalmente, insufla-se ar por meio de uma seringa, ao mesmo tempo que se ausculta a região epigástrica.
  • Em adultos, uma lavagem gástrica bem sucedida necessita de uma média de 6 a 8 litros de líquido (soro fisiológico ou água).
  • Administra-se em pequenas quantidades por vez (máximo 250 ml), visto que volumes maiores podem “empurrar” o toxicante para o duodeno.
  • Em crianças, utiliza-se 10 ml/kg até o máximo de 250 ml.
  • Repete-se este procedimento várias vezes (mínimo 8 vezes).
  • O volume retornado sempre deve ser próximo ao volume ofertado, e deve-se observar atentamente o conteúdo que retorna, na procura de restos do agente tóxico.
  • Após cerca de 2000 ml (8x), caso o líquido retornado esteja límpido, pode-se parar o procedimento e decidir ou não pelo uso do carvão ativado.

Complicações

  • Intubação traqueal inadvertida;
  • Traumatismo de vias aéreas;
  • Laringoespasmo;
  • Pneumonia aspirativa;
  • Perfuração de esôfago ou estômago (Síndrome de Mallory-Weiss);
  • Êmese excessiva;
  • Hemorragia gastrintestinal;
  • Hipotermina;
  • Estimulação vagal;
  • Arritmia cardíaca.

Fluxograma

FLUXOGRAMA_LG.jpg

Referências

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Elaborado por: Equipe CIATox em Maio/2016

Atualizado por: Jardel Jacinto, Camila Marchioni, Cláudia Regina dos Santos

Revisado por: Adriana Mello Barotto

Registrado por: Marisete Canello Resener

Data da atualização: Outubro/2023.