Mercúrio (Hg)
Nome e Sinônimos
- Mercúrio (Hg); mercury, mercury Thermometer
Descrição
Metal pesado. Encontrado na natureza, extraído principalmente como sulfeto de mercúrio (HgS) do minério Cinábrio.
Classe/Uso/Apresentação
Classe: Metal
Grupo químico: Metal pesado
Uso Comercial: Fabricação de cloro e soda cáustica, equipamentos elétricos, amálgamas dentárias, lâmpadas fluorescentes, interruptores, termostatos, tintas e pigmentos para tatuagem, garimpo artesanal de ouro. Ingrediente comumente encontrado em cremes e sabonetes para clareamento da pele e em outros cosméticos, como removedores de maquiagem para os olhos e máscaras. O Timerosal é um composto de mercúrio orgânico, e é o principal conservante utilizado em frascos de vacinas multi-dose (frascos contendo mais de uma dose).
Formas de Apresentação: O mercúrio pode existir em diferentes formas que incluem:
- Mercúrio elementar ou metálico (Hg0)
- Mercúrio divalente (Hg2+)
- Mercúrio orgânico (principalmente como metilmercúrio, MeHg).
Fontes de exposição ambiental e ocupacional do MERCÚRIO ELEMENTAR (Hg0):
- Acidentes com equipamentos contendo mercúrio metálico (TERMÔMETROS, esfignomanômetros, etc)
- Fabricação ou processamento de lâmpadas fluorescentes
- Mineração artesanal de ouro
- Usinas termelétricas a carvão
- Efluentes da indústria química e eletroeletrônica
- Amálgamas dentárias
- Cosméticos
Fontes de exposição ao MERCÚRIO ORGÂNICO (MeHg principalmente):
- Consumo de peixes e frutos do mar
- Consumo de arroz contaminado por Hg
Toxicidade
A toxicidade é dependente da forma do mercúrio e da via de exposição. O mercúrio reage com os grupos sulfidrila (SH), levando a inibição enzimática e alteração patológica das membranas celulares. |
As fontes de exposição, os órgãos-alvo, a toxicidade e o metabolismo variam conforme cada uma destas formas químicas:
MERCÚRIO ELEMENTAR (Hg0): neurotóxico e nefrotóxico
INGESTÃO: O mercúrio elementar é pouco tóxico quando ingerido devido a sua baixa absorção pelo trato gastrointestinal. Portanto, a ingestão de bolinhas de mercúrio de termômetro pode ser considerada uma exposição pouco tóxica e sem necessidade de conduta específica.''' Entretanto, o mercúrio na forma líquida pode ser convertido a vapor mesmo na temperatura ambiente, devido ao seu baixo calor latente de evaporação (295 Kj/Kg) e a sua relativa ausência no ar ambiente. Portanto, em caso de acidente com termômetros ou esfigmomanômetros, a maior preocupação deve ser com a inalação do mercúrio elementar espalhado no ambiente. O uso de aspirador de pó ou de ar condicionado no ambiente acelera a evaporação.
INALAÇÃO: Aproximadamente 80% do Hg0 gasoso inalado é absorvido para o sangue e atravessa facilmente a barreira hematoencefálica na sua forma não-oxidada, podendo provocar danos ao SNC. Com o tempo, o Hg0 no corpo é oxidado a Hg2+ e se acumula nos rins causando danos ao mesmo. O mercúrio na forma líquida pode ser convertido a vapor mesmo na temperatura ambiente, devido ao seu baixo calor latente de evaporação (295 Kj/Kg) e a sua relativa ausência no ar ambiente. São exemplos de formas de exposição ao mercúrio metálico por via inalatória:
- Exposição ocupacional de trabalhadores da indústria eletroquímica ou de fabricação de lâmpadas fluorescentes
- Garimpo de ouro
- Remoção de amálgamas dentárias
- Inalação de mercúrio metálico vaporizado acidentamente espalhado no ambiente (acidentes com termômetros, esfignomanômetros)
CONTATO CUTÂNEO: A absorção dérmica do mercúrio elementar líquido é limitada, e ocorrem em muito menor grau do que a absorção que ocorre pelos pulmões devido à inalação do mercúrio evaporado a partir da pele e do ambiente (acidentes com termômetros, esfignomanômetros)
MERCÚRIO ORGÂNICO (MeHg): neurotóxico
A exposição ao MeHg ocorre principalmente pelo consumo de peixes e frutos do mar. O MeHg é a forma com maior biodisponibilidade, sendo facilmente absorvida pelo trato gastrointestinal, entrando no sistema nervoso central (SNC) após atravessar a barreira hematoencefálica. A presença do MeHg resulta em dano permanente ao SNC, particularmente no feto em desenvolvimento.
Manifestações Clínicas
INTOXICAÇÃO AGUDA
Sintomas Gerais:
- Mialgia, febre, náusea e vômitos podem ocorrer.
- Fadiga, agitação, cefaléia, tremor, ataxia, parestesias e neuropatia periférica têm sido reportados.
- Intoxicações agudas por mercúrio vaporizado podem provocar alterações de personalidade, redução da memória e alucinações.
- A inalação aguda de mercúrio vaporizado pode causar tosse, dispnéia, dor torácica inespecífica e hipoxemia leve dentro de poucas horas da exposição.
- Pode ocorrer bronquite e bronquiolite erosiva. Pode ocorrer infiltrado difuso ao Rx do Torax (pneumonite intersticial aguda), eventualmente com evolução para Síndrome da Angústia Respiratória do Adulto (SARA).
- Pode ocorrer gosto metálico, eritema gengival, dor em orofaringe, hipersalivação e disfunção hepática. Foram relatados casos que evoluiram com proteinúria, falência renal secundária a necrose tubular aguda, síndrome nefrótica, trombocitopenia , lecucocitose e neutrofilia.
Pele:
- A inalação de vapor de mercúrio pode provocar rash eritematoso macular ou papular, envolvendo usualmente pés e mãos.
- A manipulação de mercúrio metálico pode provocar dermatite de contato.
INTOXICAÇÃO CRÔNICA
Efeitos da exposição crônica ao mercúrio metálico:
- "Eretismo" (tremor intensional e progressivo, timidez, insônia, instabilidade emocional, depressão, irritabilidade, perda de memória).
- CASOS GRAVES: alucinações, delírio, melancolia suicida. Polineuropatia subclínica com menos de 0,5 mg/L de urina.
- SÍNDROME ASTÊNICO-VEGETATIVA: sinais de eretismo com três ou mais dos seguintes sinais e sintomas - bócio, aumento da captação da tireóide, taquicardia, pulso fraco, gengivite, dermografismo e HG aumentado na urina.
- OLHOS: "Mercurialentis" (mancha marrom-acinzentada na superfície anterior do cridtalino).
- PULMÕES: Pode ocorrer fibrose pulmonar.
- RIM: proteinúria, IRA em trabalhadores industriais.
- TGI: gengivite, salivação, perda de dentes, linha escura nas gengivas, estomatite. OBS: Tríade clássica do mercurialismo: gengivite/estomatite, excitabilidade e tremor.
Efeitos decorrentes de exposição ao metilmercúrio em crianças:
- Baixo peso ao nascer
- Atraso no crescimento e neurodesenvolvimento
- Déficit de atenção e memória
- Transtorno do Espectro Autista
- Prejuízo em habilidades motoras finas
- Prejuízo em habilidades visuais espaciais
Efeitos decorrentes de exposição ao metilmercúrio em todas as idades:
- Síndrome metabólica
- Disrupção endócirna
- Perda da visão periférica
- Parestesias
- Perda da coordenação de movimentos
- Fraqueza muscular
- Dificuldades na audição, fala e marcha
Tratamento
INGESTÃO: A ingestão de mercúrio metálico em geral não resulta em toxicidade aguda pela baixa absorção gastrointestinal. Não há indicação de medidas de descontaminação ou carvão ativado. Radiografias simples podem documentar a presença e a progressão. Radiografias simples podem documentar a presença e a progressão, entretanto na maioria dos casos não é necessária.
INALAÇÃO: A inalação é a principal fonte de toxicidade significativa, especialmente após a vaporização na temperatura ambiente ou a utilização de aspirador de pó para remover resíduos. Os termômetros contém aproximadamente 500 mg de mercúrio e podem causar toxicidade significativa se vaporizado na temperatura ambiente ou por aspiradores de pó. Remova o paciente para ambiente arejado. Observar sinais de desconforto respiratório e hipoxemia. Conforme necessidade, administrar oxigênio, e utilizar broncodilatadores e corticosteroides para tratamento de broncoespasmo.
EXPOSIÇÃO OCULAR: Mercúrio elementar pode ser absorvido pela conjuntiva. Irrigar com água ou soro fisiológico por no mínimo 15 minutos.
EXPOSIÇÃO DÉRMICA: Absorção cutânea do mercúrio elementar é limitada. Pode ocorrer dermatite atópica devido ao contato prolongado.
Necessidade de atendimento em serviço de saúde:
- Pacientes assintomáticos que tenham sofrido exposição inalatória por curto período podem ser observados em casa, assim como pacientes que tenham ingerido de forma acidental quantidade menor que o conteúdo de um termômetro e que não apresentem dor abdominal.
- A presença dos seguintes sintomas representa indicação de atendimento em unidade de saúde: suspeita de intencionalidade, sintomas respiratórios agudos (tosse, dispneia, dor torácica), sintomas decorrentes de exposição crônica a mercúrio elementar (rash, tremor, perda de peso), dor abdominal decorrente de ingesta de quantidade maior de mercúrio, pacientes com mercúrio elementar depositado ou injetado em partes moles. Radiografias simples podem documentar a presença e a progressão do mercúrio elementar no corpo.
Antídoto
Ácido Dimercaptosuccínico (DMSA): 10 mg/kg via oral três vezes ao dia por cinco dias, e depois duas vezes ao dia por 14 dias. Aviado em farmácias de manipulação no Brasil.
A decisão sobre se instituir terapia de quelação é complexa e deve envolver discussão com centros de referência e profissionais com experiência. A quelação deve ser considerada em pacientes com sintomas importantes após exposição aguda ou crônica. Em pacientes assintomáticos com níveis elevados de mercúrio urinário não há dados suficientes na literatura para a recomendação de quelação.
Informações Complementares
Remoção e destinação de resíduos do ambiente após acidentes com termômetros:
Recolha imediatamente os glóbulos de mercúrio metálico utilizando papel plastificado, cartão ou fita adesiva, depositando os resíduos dentro de um vidro com água hermeticamente fechado, para ser rotulado e entregue nos postos de saúde, identificados como resíduo perigoso (Grupo B - Anvisa), para serem recolhidos por empresas especializadas e credenciadas para descontaminação de resíduos de mercúrio. Estes resíduos não devem ser descartados junto com o lixo comum.
Orientações passo a passo:
- Retirar as pessoas do local onde ocorreu o derrame de mercúrio, fechar portas e janelas do local, desligar o sistema de ventilação ou ar condicionado, se houver, para evitar dispersão de vapores de mercúrio para outros ambientes.
- Utilizar Equipamentos de Proteção Individual - EPI, tais como luvas de borracha ou látex e máscara respiratória, para proceder a limpeza do local. No caso de não dispor desses equipamentos, utilize saco plástico para proteger as mãos e cubra o nariz e a boca com um pano.
- Recolher com cuidado os restos de vidro em toalha de papel e colocar em recipiente resistente à ruptura, para evitar ferimento e fechar hermeticamente.
- Localizar as “bolinhas” de mercúrio e juntá-las com cuidado utilizando um papel cartão, fita adesiva ou similar. Recolher as gotas de mercúrio com uma seringa sem agulha.
- Transferir o mercúrio recolhido para o recipiente de plástico duro e resistente ou vidro, fechar hermeticamente e rotular. Recipientes que acondicionem mercúrio líquido ou seus resíduos contaminados devem estar armazenados com certa quantidade de água (selo hídrico) que encubram estes resíduos, para minimizar a formação de vapores de mercúrio.
- Proceder a descontaminação imediata do piso realizando a limpeza com hipoclorito de sódio ou outro produto que retire o mercúrio. Se o piso for de material que permita a penetração do mercúrio, como madeira, cimento e outros, ou possuir rachaduras, reentrâncias e frestas, após os procedimentos de coleta de mercúrio, considere removê-lo e substituí-lo.
- Todos os materiais contaminados utilizados no procedimento, inclusive as luvas, devem ser colocados em recipientes e rotulados. Os EPI utilizados devem ser descontaminados ou descartados acondicionando-os em recipientes apropriados, fechados hermeticamente e rotulados.
- A rotulagem dos recipientes deve conter a informação de resíduo perigoso contendo Mercúrio. Os recipientes rotulados devem ser encaminhados aos postos de saúde, identificados como resíduo perigoso (Grupo B - Anvisa), para serem recolhidos por empresas especializadas e credenciadas para descontaminação de resíduos de mercúrio.
- Após procedimentos de descontaminação, abrir as portas e janelas e ventilar por um período mínimo de 24 horas após a limpeza.
- Além disso, mais um cuidado deve ser tomado, como o mercúrio do piso pode aderir à sola do sapato que pode ser transportado para outros locais e expor outras pessoas aos efeitos tóxicos deste metal.
Link para o Guia Técnico sobre GERENCIAMENTO DOS RESÍDUOS DE SAÚDE NOS SERVIÇOS DE SAÚDE
Nutrientes com ação moduladora na toxicidade do Hg
Vários nutrientes têm sido associados a um efeito modulador da exposição ao Hg, reduzindo sua toxicidade. Os mecanismos envolvidos nessa modulação não são bem compreendidos. Alguns dos nutrientes com ação moduladora reportada são:
- Ácidos graxos poliinsaturados de cadeia longa (AGPICL – peixes, óleo de oliva)
- Selênio
- Iodo
- Tomates e outras fontes de licopenos
- Polifenóis presentes nos chás (chá verde e outros)
- Proantociadininas (presente nas uvas)
Toxicidade Crônica do Hg
As informações detalhadas sobre toxicidade crônica do Hg estão disponíveis no site do CIATox/SC: Toxicidade Crônica do Hg
Exames/Monitorização
- Para a maioria dos casos de acidentes domésticos com termômetros de mercúrio não é necessário nenhum exame complementar.
- A concentração de Hg na urina de 24 horas é considerada o melhor marcador para exposição crônica (o paciente deve interromper o consumo de frutos do mar durante uma semana antes da coleta, e não ter feito restaurações dentárias com amálgama nos meses anteriores). O Ideal é que a coleta de urina seja realizada em recipientes lavados com ácido para evitar contaminação da urina. Níveis de mercúrio > 10-20 mcg/L de urina tipicamente refletem exposição.
- A dosagem de Hg no sangue pode ser útil para exposições agudas. Níveis de mercúrio > 5-10 mcg/L de sangue tipicamente refletem exposição.
- Em condições de exposição constante ao MeHg (consumo de frutos do mar com pouca variação), a concentração de Hg no sangue é considerada um bom biomarcador também para toxicidade crônica.
- A dosagem do Hg em tecidos como cabelo, urina, sangue, unhas, cordão umbilical e placenta representa um desafio e envolve ainda várias incertezas.
- Em pacientes sintomáticos recomenda a dosagem de eletrólitos, função renal, glicose, parcial de urina e enzimas hepáticas.
- Em pacientes com sintomas respiratórios recomenda-se a realização de radiografia do tórax.
Referências
Current progress on understanding the impact of mercury on human health. Ha E, Basu N, Bose-O'Reilly S, Dórea JG, McSorley E, Sakamoto M, Chan HM. Environ Res. 2017 Jan;152:419-433
Diagnóstico Preliminar sobre o Mercúrio no Brasil. Ministério do Meio Ambiente – MM, Brasília 2013.
Chelation therapy in intoxications with mercury, lead and copper Yang Caoa, Marit Aralt Skaugb, Ole Andersenc, Jan Aasethd. Journal of Trace Elements in Medicine and Biology 31 (2015) 188–192
Gerenciamento dos Resíduos de Mercúrio nos Serviços de Saúde / Ministério do Meio Ambiente. Agência Nacional de Vigilância Sanitária– Brasília: MMA, 2010. 46 p. : il. color. ; 80 cm. Disponível em: http://www.jica.go.jp/brazil/portuguese/office/publications/pdf/gerenciamento.pdf GERENCIAMENTO DOS RESÍDUOS DE SAÚDE NOS SERVIÇOS DE SAÚDE
The toxicology of mercury and its compounds. Tore Syversena, Parvinder Kaurb. Journal of Trace Elements in Medicine and Biology 26 (2012) 215– 226
TOXBASE®.
MICROMEDEX®.
Elaboração: Pablo Moritz
Atualizado em: Fevereiro de 2019.
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