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Cáusticos e Corrosivos (Ácidos e Álcalis)

Nome e Sinônimos

Existem muitos produtos, tanto de uso industrial como no doméstico. Aqui são listados os principais:

  • ÁLCALIS: Hidróxido de sódio (soda cáustica), hidróxido de amônia (amônia), hidróxido de cálcio (cal), hidróxido de potássio (potassa cáustica), carbonato de cálcio, carbonato de potássio, carbonato de sódio, hipoclorito de sódio, óxido de cálcio, permanganato de sódio, silicato de sódio.
  • ÁCIDOS: Ácido clorídrico (ácido muriático), ácido acético, ácido bórico, ácido fluorídrico, ácido fórmico, ácido fosfórico, ácido lático, ácido nítrico, ácido oxálico, ácido sulfídrico, ácido sulfúrico, ácido tricloroacético, bissulfito de sódio.
  • OUTROS AGENTES: Formaldeído, cresol (creolina).

Resumo

Substâncias muito irritantes, com capacidade de destruir tecido. A ingestão de corrosivos podem causar dor imediata com queimação na boca, garganta e estômago. Isto pode ser seguido por dor abdominal, vômitos, hematêmese e dispneia. Choque hemorrágico ou hipovolêmico e obstrução das vias aéreas de laringe e / ou edema de glote são características de casos graves. Pode ocorrer perfuração das vias aéreas e digestivas, além de complicações como estenose de esôfago ou da laringe. Stridor e complicações respiratórias (incluindo a pneumonite, edema pulmonar e necrose pulmonar) pode desenvolver-se após a aspiração de materiais corrosivos.

Classe/Uso/Apresentação

Classe/Uso: Substâncias cáusticas e corrosivas, são substâncias de pH extremo (pH < 2 (ácido forte) e pH > 12 (base forte)) que agridem a superfície com a qual entram em contato, resultando em necrose. Podem ser agrupadas em duas grandes categorias, com diversos tipos de uso:

  • ÁLCALIS: substâncias usadas na limpeza de canos de cozinha, ralos, esgotos e fogões (hidróxido de sódio e/ou potássio), alvejantes domésticos, amônia, hipoclorito de sódio, permanganato de potássio, baterias alcalinas, hidróxido de sódio (soda cáustica), limpa forno “Easy-off” (contêm soda cáustica), limpadores e desinfetantes que contém fenol, alguns agentes cosméticos (alisantes para cabelos ou produtos usados para “permanente”), entre outros.
  • ÁCIDOS: antiferrugens (ácido fluorídrico, fosfórico, bórico), ácidos de baterias, usos industriais (ácido crômico, nítrico, acético, fórmico, oxálico), alvejantes (ácido muriático, sulfúrico), preparadores de superfície metálica para soldagem artesanal, limpadores de parede de concreto, limpadores de carburadores e outros.
  • OUTROS AGENTES: Formaldeído, cresol, paraquat; pilhas ou baterias em forma de botão ou disco usadas em relógios, câmeras, calculadoras contém sais metálicos cáusticos, como o cloreto de mercúrio.

Apresentação: Pó, líquido ou sólido.

Toxicidade

Dose Tóxica:

'''AGENTES ALTAMENTE TÓXICOS POR INGESTÃO.

Não há uma dose tóxica específica, mas algumas variáveis determinam a possível toxicidade e a extensão da lesão: intenção (acidental ou intencional), quantidade, apresentação sólida ou líquida, pH da substância, concentração da substância, viscosidade, tempo de contato, região afetada, presença ou ausência de conteúdo gástrico, vômitos, reexposição, aspiração do conteúdo gástrico, natureza do cáustico, doenças preexistentes.

Formas sólidas resultam em maior número de lesões na orofaringe e supraglóticas pela limitação à ingestão de grandes quantidades.

Formas líquidas podem causar queimaduras mais extensas e circunferênciais no esôfago, pelo seu total contato com a superfície do órgão.

IMPORTANTE: Se possível, consultar a monografia da substância específica, pois há diferenças importantes no gerenciamento de alguns agentes.

Mecanismo de Toxicidade:

ÁLCALIS: Causam NECROSE DE LIQUEFAÇÃO, com profunda penetração de tecidos, rapidamente progressiva, causando saponificação de gorduras e solubilização de proteínas. As queimaduras são geralmente muito maiores com álcalis. Álcalis fortes geralmente causam maior dano ao esôfago do que ao estômago, com ulcerações, perfurações e mediastinites. A ingestão de grandes volumes pode também envolver o estômago e intestino delgado.

ÁCIDOS: Causam NECROSE DE COAGULAÇÃO, com formação de coágulo, formando uma camada protetora sobre a área lesada, que limita a penetração do ácido. O estômago cheio pode proteger um pouco a lesão GÁSTRICA, principalmente do antro gástrico. Características sistêmicas após a ingestão de cáusticos podem incluir colapso circulatório, acidose metabólica, hipoxia, insuficiência respiratória, insuficiência renal aguda, hemólise e coagulação intravascular disseminada. Os ácidos fortes prejudicam mais o estômago e provocam ulceração antral, gangrena, hemorragia e perfuração. Em casos graves, extensas áreas do trato gastrointestinal pode estar envolvido.

PILHAS E BATERIAS TIPO DISCO: Podem causar lesão por efeitos corrosivos, resultando na liberação dos sais metálicos corrosivos, pelo impacto direto do corpo estranho em forma de disco e, possivelmente, pela liberação local de corrente elétrica no local do impacto.

Fases da lesão:

1. Fase inflamatória aguda: ocorre trombose vascular e necrose celular que atingem o ponto máximo nas primeiras 24 a 48 horas, causando destruição do epitélio colunar, submucosa e muscular. A mucosa necrótica desaparece no terceiro e quarto dia, formando uma úlcera.

2. Fase de granulação: há a formação de uma fibroplasia benigna por volta do 4° dia e formação de tecido de granulação no 7° dia. Perfuração ocorre provavelmente durante esta fase até duas semanas após a lesão.

3. Fase cicatrização crônica: ocorre uma formação excessiva de tecido cicatricial na submucosa e muscular, produzindo retrações.

Manifestações Clínicas

As manifestações clínicas são comuns à maioria dos agentes cáustico e corrosivos, mas se possível, consultar a monografia da substância específica, pois há diferenças importantes no gerenciamento de alguns agentes.

INGESTÃO: '''Sensação de queimadura, edema nos lábios, boca e faringe, odinofagia, disfagia, sialorréia, dor retroesternal e dorsal, vômitos, hematêmese (hemorragia digestiva alta), distúrbio da coagulação sanguínea. '''

A ingestão de ÁCIDOS pode resultar em acidose metabólica, hipotensão, falência renal aguda e coagulação intravascular disseminada.

A ausência de lesão oral visível NÃO exclui a presença de lesão esofágica ou gástrica.

SUGERE LESÃO:

ESÔFAGO: sialorréia, odinofagia, vômitos, disfagia, dor retroesternal e dorsal, mediastinite, pneumomediastino, pneumoperitônio.

LARINGE: dispnéia, laringite, afonia, edema, rouquidão ou estridor.

EMERGÊNCIA:

PERFURAÇÃO VISCERAL: dor abdominal, hipotensão, enfisema subcutâneo, sinais de peritonite aguda, febre e pneumoperitônio.

PEQUENAS PERFURAÇÕES: mediastinites lenta e progressiva estende-se por semanas com febre, dor e grave hipercatabolismo.

CHOQUE:

Agudo: hipovolemia

Tardio: sepse, por pneumonia ou mediastinites.

PILHAS E BATERIAS TIPO DISCO: Geralmente causam lesão apenas se ficarem impactadas no esôfago, levando a perfuração da aorta ou do mediastino. Se alcançar o estômago sem impactar o esôfago, ela passará pelas fezes em alguns dias, na maioria das vezes, sem causar danos.

INALAÇÃO: Irritação dos olhos e nariz com dor de garganta, tosse, aperto no peito, dor de cabeça, febre, chiado, taquicardia e confusão. Podem ocorrer pneumonite química, taquipneia, dispneia e estridor devido a edema laríngeo. O edema pulmonar com aumento da falta de ar, sibilos, hipóxia e cianose pode levar até 36 horas para se desenvolver. Neuropatia óptica foi relatada após inalação aguda e crônica. A inalação crônica pode resultar em bronquite ocupacional. Em casos graves, ocorre dano corrosivo das membranas mucosas do trato respiratório superior e inferior. Lesões por inalação graves podem resultar em rouquidão persistente, fibrose pulmonar e doença pulmonar obstrutiva crônica. A exposição prolongada pode resultar em efeitos sistêmicos.

EXPOSIÇÃO CUTÂNEA: Dor, hiperemia, irritação, queimaduras de grande espessura. Exposição grande ou prolongada pode resultar em efeitos sistêmicos.

EXPOSIÇÃO OCULAR: Irritação conjuntival, dor, equimoses, lesão no epitélio da córnea, isquemia do limbo, perda da acuidade visual e perfuração em casos severos.

Tratamento

O tratamento geralmente é comum à maioria dos agentes cáustico e corrosivos, mas se possível, consultar a monografia da substância específica, pois há diferenças importantes no gerenciamento de alguns agentes. (Por exemplo, nas intoxicações por Ácido Fluorídrico - há indicação de uso de Gluconato de Cálcio, por via tópica e em algumas situações até parenteral - checar Monografia específica no Poisindex).

Para auxiliar no tratamento e no prognóstico sempre avaliar: Tipo de substância, quantidade e concentração, intenção (voluntária ou acidental).

INGESTÃO:

1. Medidas de suporte: Avaliação das vias aéreas, respiração e circulação.

Realizar INTUBAÇÃO OROTRAQUEAL ou TRAQUEOSTOMIA quando necessário (paciente com diminuição do nível de consciência ou insuficiência respiratória)

NÃO realizar intubação nasotraqueal.

Eritema e edema importantes na supraglote e na epiglote são indicações de intubação precoce.

Sinais e sintomas evidentes de perfuração, o recomendado é a intervenção cirúrgica precoce.

2. Descontaminação:

NÃO induzir vômitos.

NÃO fazer lavagem gástrica.

NÃO usar carvão ativado.

NÃO neutralizar.

3. Diluição:

  • Substâncias ALCALINAS: Administrar precocemente um diluente (água ou leite) para os casos de ingestão de substâncias alcalinas. Não exceder 250ml em adultos, ou 15ml/Kg em crianças, pelo risco de distensão gástrica e vômitos. Depois o paciente deve ficar em repouso gástrico (NPO) até ser avaliado a necessidade ou não de endoscopia.
  • Substâncias ÁCIDAS: Há controvérsias quanto à diluição de ácidos, devido à excessiva produção de calor. Se possível, consultar substância específica. Segundo Poisindex, em pacientes sem vômitos ou desconforto respiratório que são capazes de engolir, diluir com leite ou água (até 240ml em adultos e 120ml em crianças), se possível, logo após a ingestão; então NPO até depois da endoscopia.

Observação: Questionar a tolerância da pessoa intoxicada ao leite. Algumas pessoas podem sentir náuseas com a ingestão de leite, sendo preferível a diluição com água. Ficar atento a possibilidade de ingestão de Carbureto de Cálcio - apesar de não ser considerado cáustico, a substância é inflamável e se tiver contato com água pode se aquecer a temperaturas superiores a 3000 graus celsius, ou seja na ingestão de Carbureto de Cálcio a diluição é totalmente contraindicada.

  • LAVAR boca, face e outras áreas de contato.

4. Antieméticos: Administrar antieméticos, se paciente apresentar vômitos, para prevenir lesão esofágica adicional.

5. Analgesia: Deve-se fornecer analgesia adequada; para casos graves, analgesia intravenosa com narcóticos pode ser necessária.

6. Endoscopia (EDA): Todas as vítimas de acidentes cáusticos que apresentem sinais e sintomas de lesão devem realizar avaliação endoscópica. Estudos mostram que em torno de 20% dos pacientes sem lesões em orofaringe, podem apresentar lesão de esôfago.A EDA deve ser realizada no prazo de até 24h após a ingestão.

SE NÃO HOUVER DISPONIBILIDADE DE ENDOSCOPIA ENCAMINHAR O PACIENTE, EM CASOS GRAVES.

Emergência: em casos de suspeita de lesões graves, realizar EDA precoce (a menos que existam sinais e sintomas evidentes de perfuração - nestes casos o recomendado é a cirurgia imediata).

Ácidos: a endoscopia é recomendada preferencialmente até 24h após a ingestão.

Álcalis: a endoscopia é recomendada preferencialmente em até 24h após a ingestão.

Antes da endoscopia:

  • Manter o paciente em jejum
  • Realizar hidratação EV

Contraindicações da endoscopia:

  • Sinais e sintomas evidentes de perfuração (dor abdominal, hipotensão, enfisema subcutâneo, sinais de peritonite aguda, febre e pneumoperitônio). Nestes casos é recomendado cirurgia imediata.
  • Após 48horas da ingestão (a mucosa do TGI pode estar muito friável e a própria passagem do endoscópio pode provocar perfuração)
  • Obstrução das vias aéreas
  • Instabilidade hemodinâmica

Classificação endoscópica das lesões:

  • 1° GRAU: Hiperemia da mucosa, descamação do epitélio superficial, membrana da mucosa intacta. NÃO HAVERÁ CONSTRIÇÃO ESOFÁGICA.
  • 2° GRAU: Hiperemia da mucosa, bolhas e ulcerações, áreas de exsudatos membranosos na mucosa. RISCO DE ESTENOSE 15 A 30%.
    • 2a: úlceras superficiais
    • 2b: úlceras focais profundas ou circunferências
  • 3° GRAU: Hiperemia, perda total do epitélio esofágico. O RISCO DE ESTENOSE PODE CHEGAR A 100%
    • 3a: áreas distribuídas de necrose
    • 3b: áreas extensas de necrose

7. Inibidores da Bomba de prótons: Administrados precocemente podem diminuir o risco de formação posterior de estenose.

Omeprazol:

  • Adultos: 40mg EV de 12 em 12 horas nos 3 primeiros dias e após 1 vez ao dia.
  • Crianças: 0,7 a 1 mg/kg de 12 em 12 horas nos 3 primeiros dias e após 1 vez ao dia.

8. Corticóides: Não há evidência que diminui o risco de estenose. Podem ser efetivos em pacientes em casos de ingestão de cáusticos que apresentem dispnéia, estridor e outras evidências do comprometimento respiratório

9. Antibióticos: Recomendado uso em casos de perfuração ou infecção secundária. SEMPRE QUE USAR CORTICOIDE DEVE-SE USAR ANTIBIÓTICO. Sugestão: CEFAZOLINA EV.

10. Suporte nutricional: A decisão sobre qual tipo de nutrição deve ser feito preferencialmente pela equipe da Gastroenterologia.

  • Lesão Grau I: pode ser administrado fluído oral e alimentação por via oral.
  • Lesão Grau II: Nos casos de lesão IIa, pode ser inclusive passada uma sonda nasoenteral para alimentação durante a EDA e a dieta líquida liberada após 48 a 72 horas. Nos casos de lesão II b pode ser necessária nutrição parenteral. Equipe da Gastroenterologia deve decidir.
  • Lesão Grau III: avaliar realização de gastrostomia/jejunostomia/nutrição parenteral. Equipe da Gastroenterologia deve decidir.

11. Exames complementares:

  • Hemograma
  • Eletrólitos
  • Glicose
  • Ureia
  • Creatinina
  • TAP
  • TTPA
  • Gasometria arterial
  • Radiografia de tórax: avaliar mediastino, presença de enfisema subcutâneo, pneumotórax, pneumoperitônio, derrames pleurais, parênquima pulmonar (pneumonite de aspiração).
  • Radiografia de abdome: distensão de alças, pneumoperitônio, presença de líquido livre.

PILHAS E BATERIAS TIPO DISCO: Radiografias de tórax e de abdome geralmente revelam baterias ou pilhas impactadas. Se alojadas no esôfago devem ser removidas imediatamente por endoscopia para prevenir a perfuração. Se estiverem no estômago ou intestino não deverão ser removidas, a menos que apareçam sinais de perfuração ou obstrução.

INALAÇÃO: Retirar imediatamente o paciente da exposição.

Se tosse ou dispneia, verificar saturação de oxigênio e atentar para a possibilidade de irritação do trato respiratório e pneumonite. Se necessário, fornecer oxigênio suplementar e observar com atenção sinais de obstrução progressiva da via aérea ou edema pulmonar não cardiogênico.

EXPOSIÇÃO CUTÂNEA: Retirar roupas contaminadas e qualquer material particulado aderente à pele.

LAVAR a pele exposta com água abundante por pelo menos 15 minutos ou mais, dependendo da concentração, quantidade e duração da exposição à substância química. Lembrar que no caso do ácido fluorídrico é indicado o uso de Gluconato de Cálcio (checar monografia específica no Poisindex

  • Hydrofluoric Acid )

EXPOSIÇÃO OCULAR: Irrigar os olhos com água abundante (ou solução salina 0,9%) por pelo menos 30 min. Considerar avaliação oftalmológica. A extensão da lesão ocular (grau de opacificação da córnea e branqueamento perilimbal) pode não ser aparente nas primeiras 48 a 72 horas após a queimadura.

Exames/Monitorização

  • Hemograma
  • Eletrólitos
  • Glicose
  • Uréia
  • Creatinina
  • TAP
  • TTPA
  • Gasometria arterial
  • Radiografia de tórax: avaliar mediastino, presença de enfisema subcutâneo, pneumotórax, pneumoperitônio, derrames pleurais, parênquima pulmonar (pneumonite de aspiração).
  • Radiografia de abdome: distensão de alças, pneumoperitônio, presença de líquido livre.

Bibliografia

ANDRADE, A. et al. Toxicologia na prática clínica. 2ª edição. Belo Horizonte: Folium, 2013.

MICROMEDEX Healthcare Series – POISINDEX - Corrosives-Alkaline. Disponível em:http://www.micromedexsolutions.com Acesso em: maio 2018.

MICROMEDEX Healthcare Series – POISINDEX - Acids. Disponível em:http://www.micromedexsolutions.com Acesso em: maio 2018.

TOXBASE (NPIS). Alkalis(Corrosive Poisons). Disponível em: http://www.toxbase.org/. Acesso em: maio 2018.

TOXBASE (NPIS). Acids (Corrosive Poisons). Disponível em: http://www.toxbase.org/. Acesso em: maio 2018.

OLSON, K.R. Manual de toxicologia clínica. 6ª edição. Editora Artmed. Porto Alegre, 2014.

Revisado por: Equipe do CIATox/SC. Última atualização: Junho 2018.