LSD (Dietilamida do Ácido Lisérgico)
Nome e Sinônimos
Dietilamida do ácido lisérgico, LSD, doce, ácido (também usado para Ecstasy), papel, microponto, ponto, gota, (''Lysergic Acid Diethylamide).
Atenção: O uso de um termo de gíria para tentar identificar uma droga de abuso é potencialmente perigoso, pois existem muitas variações regionais e os termos mudam ao longo do tempo.
LSD na forma de papel (selos) com diferentes desenhos.
Imagens representativas de papéis apreendidos em Santa Catarina (Fonte: Referência 4)
Resumo
O LSD, dietilamida do ácido lisérgico, é uma substância alucinógena. O uso no Brasil é frequentemente relatado e tem sido comumente utilizado por jovens de todas as classes sociais. O LSD atua como agonista dos receptores serotoninérgicos centrais (5-HT2) e, assim sendo, casos de intoxicação pode levar à Síndrome Serotoninérgica. Apresenta baixa toxicidade aguda, a menos que seja utilizada em doses altas. Casos graves são raros, mas podem cursar com coma, parada respiratória, colapso sistêmico, vômitos e convulsões. O tratamento é apenas suportivo. A presença de outras substâncias psicoativas em papéis (selos) utilizados como sendo LSD deve ser levada em conta no tratamento de pacientes (ver informações complementares no final desta monografia)
Classe/Uso/Apresentação
Classe: Drogas de abusos – alucinógenos/ agonista dos receptores de setoronina 5-HT.
Uso: Chegou ao Brasil por volta de 1960 para uso medicinal, sendo em seguida proibido e posteriormente difundido para uso recreacional. Apresenta alto poder alucinógeno. O isômero-d é o alucinogênio extremamente potente, enquanto o isômero-l parece estar inativo.
Apresentação: Pode ser encontrado na forma de barras, cápsulas, tiras de gelatina, líquidos, micro-pontos ou folhas de papel secante (como selos ou autocolantes), sendo que uma dose média é de 50 a 75 microgramas.
Via: É consumido por via oral, absorção sub-lingual, injetado ou inalado.
Atenção: A pureza dos ingredientes em drogas de rua pode variar bastante (pode conter como contaminantes, por exemplo, açúcar, estricnina, fenciclidina, cafeína e cocaína).
Toxicidade
ATENÇÃO |
Apresenta toxicidade aguda baixa, a menos que seja utilizado em altas doses. Todos aqueles que foram expostos como resultado de tentativa de suicídio devem ser encaminhados para avaliação. Todas as crianças e adultos sintomáticos devem ser encaminhados para avaliação médica. |
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1. Dose Tóxica: Apresenta toxicidade aguda baixa, a menos que seja utilizado em altas doses. Doses letais mínimas em humanos variam de 0,2 a 1 mg/kg. No entanto, os óbitos são geralmente devidos aos traumas secundários às alucinações ou percepções alteradas e não devido à ação direta da droga. Uma dose única de 100 a 400 µg de LSD pode produzir um estado alterado de consciência. Se ingerido com outros agentes serotoninérgicos, existe um risco maior de toxicidade à Serotonina (Síndrome Serotoninérgica). A paranoia ou os ataques de pânico podem ocorrer com qualquer dose e dependerá do contexto e do estado emocional atual do paciente.
2. Mecanismo de Ação: Embora seu mecanismo de ação não seja exatamente compreendido, sabe-se que a estrutura química é semelhante ao neurotransmissor serotonina. Por isso, o LSD atua como agonista parcial ou total dos receptores serotoninérgicos (5-HT). Existem sete tipos de receptores serotoninérgicos (5-HT1 a 5-HT7) muitos deles possuindo subtipos, para os quais o LSD apresenta elevada afinidade. Dados científicos demonstram que os tipos 5-HT1 e 5-HT2A são os mais importantes para a Síndrome Serotoninérgica, tendo o receptor 5-HT2 como provável sítio de ação principal no efeito alucinógeno. Este receptor é encontrado em sua maior densidade no córtex cerebral, local mais provável para a ação alucinógena. Embora a maioria da investigação tenha incidido sobre o papel da serotonina para alucinações induzidas por drogas, outros neurotransmissores estão envolvidos. A estimulação dos receptores 5-HT2A aumenta liberação de glutamato na camada cortical das células piramidais. Por outro lado, o LSD é capaz de estimular receptores da dopamina (D1 e D2), de modular o N-metil-D -aspartato (NMDA), entre outros. A diminuição do neurotransmissor inibitório ou aumento do excitatório nesta região do cérebro pode levar a uma sobrecarga sensorial que se manifesta clinicamente como sintomas de psicose.
3. Farmacocinética: O LSD é completamente absorvido no trato gastrointestinal. O início da ação geralmente ocorre 30 a 90 minutos após a ingestão, atingindo seu pico de ação após 1,5 a 2,5 horas. Os sintomas podem durar até 10 a 12 horas. A meia-vida de eliminação média é de 3 a 4 horas. O LSD sofre extenso metabolismo hepático via N-desmetilação, N-desetilação, e hidroxilação em metabólitos inativos. Apenas uma pequena fração é excretada na urina inalterado. Seus metabólitos continuam a ser detectáveis na urina durante 4 dias após ingestão. É altamente ligado a proteínas plasmáticas (90%) e tem um baixo volume de distribuição (0,28 L/kg).
Manifestações Clínicas
Em dose recreativa as manifestações compreendem distúrbios psicológicos, neurocognitivos e somáticos.
Os sintomas mais comuns são as alucinações bem como as mudanças de comportamento podendo apresentar confusão, agitação, paranoia, flutuações de humor, reações de pânico e reações psicóticas.
A recuperação geralmente ocorre após algumas horas, mas alucinações ocasionalmente ocorrem até 48h após a ingestão e estados psicóticos podem durar até 3-4 dias.
As alterações perceptivas podem começar após 30 minutos e incluir alucinações visuais, táteis e auditivas, bem como distorções de cor, distância, forma, tempo e sinestesia.
De 2 a 12 horas a partir da ingestão, o paciente pode sentir euforia, mudanças de humor, sentimentos de despersonalização, desrealização e perda da imagem corporal.
Mesmo anos após a exposição podem ocorrer imprevisivelmente flashbacks alucinatórios e reações de pânico.
A sintomatologia também pode incluir: midríase, taquicardia, taquipneia, hipertensão, hipertermia, espasmos, tontura, vômito e diarreia.
Overdose maciça é rara, mas pode causar coma, parada respiratória, colapso sistêmico, vômitos e hipertermia.
O hemograma pode apresentar plaquetopenia.
Rabdomiólise já foi relatada.
Em pacientes com toxicidade severa podem ocorrer convulsões.
SÍNDROME SEROTONINÉRGICA: Verificar se o paciente é usuário de fármacos serotoninérgicos, pois, apresentam maior chance de estabelecer a SÍNDROME SEROTONINÉRGICA a qual se apresenta com: efeitos do SNC (incluindo coma ou agitação psicomotora), hiperpirexia e sinais/sintomas de excitabilidade neuromuscular (incluindo clônus e elevação de CK). A morte de pacientes por toxicidade relacionada à serotonina pode ser causada por hiperpirexia com insuficiência de múltiplos órgãos associada.
→Diagnóstico diferencial: outros medicamentos e substâncias que podem causar hiperestimulação e/ou psicose, como estimulantes como cocaína ou fenciclidina. Substâncias alucinógenas também podem ter uma apresentação semelhante. Outras causas de quadros psicóticos agudos também devem estar no diferencial.
Tratamento
Não há antídotos e o tratamento deve ser suportivo. Importante manter paciente em hidratação endovenosa.
'''1. Vias aéreas: ''' Proteção das vias aéreas em caso de rebaixamento do nível de consciência (Glasgow < ou = 8) ou depressão respiratória. Em geral, não há motivo para intubar o paciente precocemente.
'''2. Medidas de descontaminação: ''' A descontaminação gástrica geralmente não é indicada, mas pode ser considerada para overdoses maciças que se apresentam precocemente. O carvão ativado está indicado apenas em ingestão de grande quantidade, com atendimento precoce e se o paciente estiver cooperativo sem sinais de sonolência ou risco de broncoaspiração. O carvão ativado geralmente tem pouco valor, pois o LSD é rapidamente absorvido pelo trato gastrointestinal. Lavagem gástrica, bem como múltiplas doses de carvão ativado estão contraindicados.
3. Agitação: : Certifique-se de que outras causas sejam excluídas (por exemplo, hipóxia, infecção e hipoglicemia). Tente reduzir os estímulos ambientais (por exemplo, sala silenciosa) e fornecendo necessidades básicas (por exemplo, um parente próximo, um cobertor quente e comida (se apropriado)). Pacientes com agitação severa devem ser sedados com benzodiazepínicos (lorazepam ou diazepam). Pacientes com agitação prolongada podem desenvolver rabdomiólise (tratamento abaixo).
- Para farmacoterapia em adultos: administre uma dose inicial de diazepam por via oral ou intravenosa (10 a 20 mg) ou lorazepam (1 a 2 mg). Bolus adicionais, administrados IV, podem ser administrados se o paciente permanecer agitado, desde que não haja comprometimento da função respiratória.
4. Síndrome serotoninérgica: A maioria dos casos leves resolverá espontaneamente dentro de 24 horas. O tratamento inicial é com benzodiazepínicos. Em casos de toxicidade severa refratária pode ser considerado o uso de ciproeptadina (primeira escolha) O uso da clorpromazina também pode ser utilizado porém sem evidência científica adequada (não utilizar se houver suspeita de Síndrome Neuroléptica Maligna)
- Dose adulto: ciproheptadina (12 mg por via oral ou por sonda naso-gástrica, seguida de 4 a 8 mg a cada 6 horas em adultos); Clorpromazina: (12,5 a 25 mg IV, seguida de 25 mg via oral a cada 6 horas)
- Dose crianças com 13 anos ou mais: ciproheptadina (0,25 mg/kg/dia (máx 12 mg) em 4 doses divididas).
5. Hipertermia: Observar temperatura, hipertermia severa é uma das causas de mortalidade, portanto a intervenção deve ser rápida. Hipertermias brandas e moderadas devem ser tratadas com medidas convencionais (ventilador ou bolsas de gelo nas axilas e virilhas). Quando a aferição de temperatura exceder os 38ºC, devem ser adotadas medidas urgentes de resfriamento (como banhos de gelo e lavagem com fluído frio).
6. Rabdomiólise: Se houver rabdomiólise (atividade da CK superior a 5 x o limite superior da faixa normal, especialmente se CK > 5000 UI/L), pode ocorrer insuficiência renal. Administre a reposição volêmica por via intravenosa o mais rápido possível e continue a fim de manter um débito urinário ≥1-2 ml / kg / h. A alcalinização urinária NÃO é recomendada rotineiramente. No entanto se CK muito elevada, particularmente se estiver acima de 10.000, pode ser usado bicarbonato para manter pH urinário alcalino e diminuir o risco de precipitação de mioglobina nos túbulos renais.
7. Aumento da eliminação: A hemodiálise, hemodiafiltração ou hemofiltração pode ser necessária se houver insuficiência renal aguda ou se houver hipercalemia grave, mas esses procedimentos não são úteis para eliminar a droga. Embora a acidificação urinária possa aumentar a concentração de alguns agentes na urina, não aumentará significativamente a eliminação total do corpo e poderá agravar a insuficiência renal mioglobinúrica.
ALTA HOSPITALAR |
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Exames/Monitorização
Pacientes em observação: realizar ECG. Recomenda-se a repetição de ECG, especialmente em pacientes sintomáticos.
Em pacientes com evidência de toxicidade sistêmica: monitorar pulso, consciência, temperatura e pressão arterial e solicitar hemograma, ureia, creatinina, eletrólitos, CPK e transaminases.
Pacientes muito agitados: monitorização cardíaca, principalmente se realizada sedação.
Pacientes com estado mental alterado: deve ser realizado cuidadoso exame neurológico e avaliar necessidade de TC de crânio.
Atenção: os níveis de LSD no plasma e na urina são mensuráveis e quantificados por várias técnicas, mas não são clinicamente úteis. O LSD não é detectado na maioria dos exames de rotina. No laboratório do Hospital Universitário NÃO é realizada esta análise. Entretanto, no exame Triagem de Drogas de Abuso/Medicamentos pode ocorrer reação cruzada com os derivados da anfetamina (a depender do teste usado).
Informações Complementares
A presença de outras substâncias psicoativas em papéis (selos) utilizados como sendo LSD deve ser levada em conta no tratamento de pacientes.
Um estudo retrospectivo de seis anos, avaliou a presença e o perfil de novas substâncias psicoativas (NPS) em papeis (selos) de LSD apreendidos no Estado de Santa Catarina, no período de 2011 a 2017. A equipe de perícia criminal do governo estadual realizou análises para determinar a composição química dos selos. Durante o período avaliado, houve um aumento considerável na apreensão. Curiosamente, enquanto em 2011, 100% dos papeis continham LSD, esse número diminuiu para 0,1% em 2014 e atingiu 17,6% em 2017, quando até 25 substâncias diferentes foram detectadas nos papeis apreendidos. Drogas como DOx, NBOMe, fentanil, derivados da mescalina, triptaminas, catinonas e canabinóides sintéticos foram detectados e se tornaram as principais substâncias encontradas nos papeis. Em alguns casos, mais de uma substância foi encontrada. Abaixo a tabela com as substâncias detectadas no estudo.
Fonte: B. S. Boff, J. Silveira Filho, K. Nonemacher, S. D. Schroeder, M.
D. Arbo, K. Z. Rezin. New psychoactive substances (NPS) prevalence over
LSD in blotter seized in State of Santa Catarina, Brazil: A six-year
retrospective study, Forensic Science International, Volume 306, 2020.
Referências
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Toxbase (NPIS). Lysergic Acid Diethylamide (LSD). Disponível em: https://www.toxbase.org/. Acesso em: Junho 2020.
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Poisindex (Micromedex). Baclofen. LSD. Disponível em: https://www.micromedexsolutions.com. Acesso em: Junho 2020.
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OLSON, K.R. Manual de toxicologia clínica. 6ª edição. Editora Artmed. Porto Alegre, 2014.
-
B. S. Boff, J. Silveira Filho, K. Nonemacher, S. D. Schroeder, M. D. Arbo, K. Z. Rezin. New psychoactive substances (NPS) prevalence over LSD in blotter seized in State of Santa Catarina, Brazil: A six-year retrospective study, Forensic Science International, Volume 306, 2020.
Elaborado por: Ingrid Caroline Melo Cordeiro, Lucas Eduardo Fernandes, Manoela Valente Costa e Thaina Koerich Nobre Revisado por: Camila Marchioni, Pablo Moritz, Adriana Mello Barotto Registrado por: Marisete Canello Resener Data: Agosto/2021. |
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